Consumo de gás hilariante no futebol pode botar carreiras em risco

O uso do gás hilariante  (ou gás do riso) por jogadores de futebol pode trazer consequências mais graves do que se imagina. O alerta foi feito pelo jornal francês “L’Équipe”, que ouviu agentes de jogadores, preparadores físicos e médicos. A reportagem mostra que muitos clubes preferiram não se manifestar sobre o assunto e que nem todos estariam conscientes da dimensão que o consumo desse gás pode alcançar.

Um agente – que cuida de 60 jogadores – revelou que o gás circula bastante à noite, tanto quanto o shisha (dispositivo conhecido como Narguilé, usado para aspirar a fumaça do tabaco, que passa por uma pequena mangueira com filtro de água). Segundo ele, os jogadores evitam mencionar o fato em redes sociais para não causar má impressão.

É notória a repercussão negativa de um vídeo que viralizou em 2018 na internet. Nas imagens, os jogadores Aubameyang, Özil, Lacazette, Kolasinac e Guendouzi inalam o gás – chamado cientificamente de óxido nitroso – enquanto conversam e riem. Na época todos jogavam no Arsenal, da Inglaterra. Guendouzi chega a cair no banco após aspirar o gás.  Dois anos depois, Lacazette apareceu em outro vídeo, fazendo o mesmo, e a imprensa inglesa noticiou.

Grégory Lange, treinador e gestor do centro de cuidado, apoio e prevenção de adicção (consumo de drogas ilícitas) em Évreux, na França, diz que “não é estranho que o gás hilariante circule no mundo do futebol, já que são os jovens desta faixa etária, de 15 a 25 anos, que mais o consomem”.

Um outro agente revelou que os balões de gás são vistos como recurso em busca de adrenalina e relaxamento. “Os caras fazem isso por cinco horas seguidas”, disse, acrescentando que a prática é comum tanto em bares como nas casas dos jogadores.

O consumo desse gás pode provocar efeitos colaterais que prejudicam a saúde e o desempenho. Podem ocorrer queimaduras, falta de oxigênio, quedas, perda de consciência e tonteira, entre outros problemas.

Quem explica é Jérôme de Sèze, professor de neurologia do Hospital Universitário de Estrasburgo. Ele é pesquisador e fez um estudo sobre o óxido nitroso.

“Quando você inala esse gás num balão, ele se encontra no sangue. Não desempenha papel direto no cérebro. Mas cria uma deficiência de vitamina B12, que é importante para o sistema nervoso, principalmente para a medula espinhal. Esse gás, gradualmente, cria várias complicações”.

Alexandre Marles, preparador físico autônomo, disse que, geralmente, um membro da comitiva leva o gás hilariante e vários jogadores querem testar. Quem experimenta e não prossegue no consumo não sofre as consequências. Mas quem persiste, repetindo a prática, corre sérios riscos.

“Prejudica a atividade cardíaca, nervosa e muscular, com riscos de lesões e fadiga rápida durante o exercício. E dificulta a recuperação”, afirma.

Um médico da Ligue 1,  a principal liga de futebol da França, disse que existem discussões sobre esse tema entre os jogadores e que os clubes se preocupam com as consequências. Mas não se manifestam. Recentemente, segundo ele, um jovem promissor foi severamente afetado, o que lhe custou a carreira na Ligue 1.

O médico ressalta, porém, que, se a pessoa desistir do gás e fizer tratamento, é possível, geralmente, reverter o quadro, com injeções sucessivas de vitamina B12, em altas doses, durante semanas ou até meses.

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