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Familiares seguem na busca por respostas e direitos quatro anos após acidente aéreo da Chape

Neste domingo o acidente com o avião que levava a delegação da Chapecoense para a decisão da Copa Sul-Americana, e que deixou 71 mortos  (entre jogadores, funcionários, dirigentes, convidados e jornalistas), completa quatro anos. Em novembro de 2016, a delegação deixava Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia, com destino ao Aeroporto José María Córdova em Rionegro, na Colômbia, quando teve sua trajetória interrompida a poucos metros de distância do destino.

Ao longo destes quatro anos da tragédia, as famílias das vítimas seguem incansáveis na busca pela indenização do seguro. A aeronave da LaMia tinha uma apólice de seguro de 25 milhões de dólares (valor considerado muito inferior ao utilizado para voos daquela espécie). Enquanto as famílias destacam inconsistências em assuntos relevantes como a contratação do seguro, a liberação do voo para a Colômbia, e lutam incessantemente na justiça pelos seus direitos, a seguradora se opõe a realizar o pagamento por afirmar que haviam irregularidades no voo. De lá pra cá, as famílias lutam em algumas frentes: ação civil pública movida pelo Ministério Público de Santa Catarina contra as partes envolvidas (empresa aérea, seguradora, resseguradora e corretora), ação nos Estados Unidos e a CPI da Chapecoense no Senado.

Fabienne Belle (à dir.), presidente da AFAV-C, na CPI da Chapecoense, ao lado de Mara Paiva, viúva de Mario Sérgio (Divulgação/Senado)

“A realidade é que quase nenhum dos envolvidos foi responsabilizado pelo acidente ainda, o que é muito triste. O acidente é o resultado da negligência de várias empresas e agentes públicos e o não pagamento das indenizações é fruto do descaso das empresas responsáveis pelo seguro e resseguro que protegia a aeronave e a operação da empresa LaMia. Triste saber que tantas famílias, num acidente que chocou o mundo, são vítimas do descaso mesmo após tanto tempo”, disse Mara Paiva, vice-presidente da Associação de Familiares e Amigos das Vítimas do Voo da Chapecoense (AFAV-C).

“Os seguros da companhia não foram pagos a ninguém. O que foi oferecido pela corretora e seguradora foi um fundo humanitário. Muitos acabaram assinando pela necessidade do dinheiro. No entanto, quem aceitou a proposta teve de assinar um termo de quitação abrindo mão de seus direitos legais e comprometendo-se a não entrar em nenhum tipo de ação indenizatória contra os responsáveis pelo acidente”, afirmou Fabienne Belle, presidente da AFAV-C e viúva do fisiologista Luiz César Martins Cunha.

O valor deste fundo humanitário seria de 225 mil dólares (o que corresponde a aproximadamente R$ 960 mil) para cada família, valor considerado muito inferior ao calculado pela AFAV-C, que estima que cada família deveria receber entre 4 milhões e 5 milhões de dólares.

“Ainda não recebemos indenização alguma, até porque são muitas questões envolvidas: falta de combustível, restrição da apólice a qual a seguradora afirma que o avião não poderia viajar para a Colômbia… Tanto seguradora quanto resseguradora se apoiam nestas duas questões para o não pagamento da apólice”. O mais importante nessa jornada é que embora muito tenha sido feito, conseguimos, por meio da CPI no Senado, mostrar ao mundo e autoridades competentes todo o trabalho em busca da verdade sobre o acidente. Mostramos que houve uma sucessão de erros e a negligência de diversas empresas que levaram a essa tragédia. Tudo isso está interligado. O acidente iniciou muito antes do avião ter caído. Deixaram de cumprir a norma que é a proteção à vida” – completou Fabienne, ao Jogada10.

 

Relação entre famílias das vítimas e Chapecoense

Quanto à relação propriamente dita das famílias com a própria Chapecoense, foi acordado um termo de ajuste de conduta, estabelecendo que o clube consulte os herdeiros antes de tomar qualquer atitude que envolva as vítimas, assim como a inclusão do clube na luta pelas indenizações.

Ao Jogada10, Ilan Bortoluzzi Nazário, vice-presidente jurídico da Chapecoense, informou que atualmente são 24 processos trabalhistas já acordados com as famílias. Sete estão em andamento ainda sem um acordo, enquanto outros seis são acordos extrajudiciais.

“Buscaremos fazer acordos com todas as famílias. Essa é a prioridade do clube. Nosso relacionamento com os familiares e seus procuradores é bom. Dentro de nossas possibilidades temos pago os acordos, e eles têm entendido isso. Este ano de 2020 não conseguimos formalizar novos acordos, ainda existem algumas ações pendentes. Assim que melhorarmos nossas condições financeiras, procuraremos novamente as famílias. Também temos tido dificuldades com alguns acordos extrajudiciais, mas os procuradores têm sido compreensivos, tolerantes conosco. Somos muito gratos por isso. As famílias dos nossos ídolos são nossas famílias também. Logo essa pandemia vai passar, a Chape vai voltar à Série A e assim conseguir dar um melhor amparo a todos”, afirmou.

 

Ações no Brasil, Estados Unidos e CPI da Chapecoense

Em novembro de 2019, o Ministério Público Federal (MPF) de Chapecó ajuizou uma ação civil pública requerendo a condenação da companhia aérea LaMia, a seguradora Bisa (responsável pela apólice sediada na Bolívia), a resseguradora Tokio Marine (que ficou com o prêmio do valor do seguro) e a corretora AON (uma das maiores do mundo), e a reparação de danos morais e materiais em favor da famílias de 68 vítimas brasileiras do acidente. O valor do pedido foi de 300 milhões de dólares. A ação, no entanto, vem encontrando problemas para promover a citação de alguns dos envolvidos que são residentes no exterior, o que traz morosidade no andamento do processo.

“Por intermédio do Ministério da Justiça e do Itamaraty, conseguimos finalmente que toda a documentação fosse encaminhada à Bolívia para que seja dado andamento à ação civil pública no Brasil”, disse, ao Jogada10, o advogado da AFAV-C, Josmeyr Oliveira, que deu detalhes sobre a ação nos Estados Unidos:

“Das famílias que buscaram seus direitos no Brasil, 37 delas decidiram movimentar-se nos Estados Unidos porque gostariam que as investigações também acontecessem por lá. Conseguimos ter acesso a todos os computadores da LaMia e descobrimos que a aeronave que caiu era assegurada por 300 milhões de dólares sem nenhuma cláusula de exclusão. Mas em 2016 a LaMia Bolívia conseguiu um seguro de 25 milhões de dólares com duas cláusulas de exclusão: a primeira dizia que a aeronave não poderia pousar em quatro países, um deles justamente a Colômbia; a segunda, de que o avião não poderia voar com passageiros de risco majorado, ou seja, pessoas que representassem uma indenização de alto valor. O detalhe é que, 15 dias antes da tragédia, o então presidente boliviano Evo Morález viajou naquele avião. Também descobrimos no computador da LaMia que a corretora AON, que sempre obrigou que o seguro da aeronave fosse de 300 milhões de dólares, aceitou, por e-mail, que o seguro fosse de menos de 10% (25 milhões de dólares) com estas duas cláusulas de exclusão. Esse é o ponto em que estamos discutindo na justiça”.

Em setembro de 2020, a Justiça americana decidiu de modo favorável às 37 famílias por uma indenização de R$ 4,8 bilhões, por entender que faz sentido a LaMia assumir a culpa e que estas famílias teriam o direito de pleitear o mesmo direito que a companhia aérea teve de discutir a responsabilidade civil do corretor da AON ao ter errado o cálculo do risco de uma aeronave para 97 passageiros.

“Um dos sócios morreu no acidente, o piloto Quiroga. O outro sócio, o Marco Antonio Rocha, nós o localizamos em Miami e conseguimos que ele aceitasse em passar para as famílias o direito delas discutirem com a corretora. Conseguimos que o Marco Rocha falasse na CPI da Chapecoense, que está por dentro de todos os assuntos referentes à esta matéria. A Bolívia poderia não ter permitido esse voo porque havia uma cláusula. A Colômbia poderia não ter aceitado receber esse voo. Erraram, e erraram muito feio sobre isso”.

O próximo passo da Justiça dos Estados Unidos é ir em busca da resseguradora Tokio Marine e da corretora AON. Enquanto isso, as famílias seguem sem receber indenização quatro anos após o trágico acidente.

 

Felipe David

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