Nelinho fez história no futebol mineiro. Como lateral-direito, ganhou oito estaduais: metade pelo Atlético e a outra metade pelo Cruzeiro. Ídolo de ambas as torcidas, comemorou como poucos a conquista do Brasileirão pelo Galo. Para ele, Hulk, dono de um chute poderoso como o que tinha e o caracterizou nos anos 70 e 80, foi o principal destaque da competição com méritos. Nelinho elogia os esforços dos dirigentes e a gestão séria do Alvinegro. Sua única preocupação é o Cruzeiro, clube pelo qual ganhou a Libertadores em 1976. Aos 71 anos de idade, ele teme que o time azul não volte tão cedo à Série A e ainda corra risco de cair para a terceira divisão.

Nelinho, ídolo das duas grandes torcidas mineiras – Reprodução de video

J10 – Você é ídolo de duas grandes torcidas mineiras, uma das quais a do Atlético. Como viu essa conquista do Brasileiro pelo Galo?

Nelinho – Sempre torci para equipes que, além da tradição, investem muito em futebol, com boas contratações. Gosto de dirigente que pensa grande. A partir do momento em que o Rubens Menin resolveu ajudar o Atlético, ele entrou com essa mentalidade. Torci muito para o Galo ser campeão, porque isso o incentivaria a continuar investindo fortemente. E não só isso: também outros clubes passam a acreditar que se investir corretamente o retorno chega. Por exemplo, quando o Flamengo foi bicampeão, cheguei a achar que seria tri, mas ele foi um pouco prejudicado, até mais do que os outros clubes, e ao perder pontos importantes durante o Brasileirão, a partir de um certo momento teve a obrigação de não poder mais empatar ou perder e ainda ter que torcer para o Atlético derrapar, isso para poder se aproximar do Galo. Tudo isso interfere na parte mental dos jogadores. Já o Atlético, por sua vez, soube se aproveitar desse fator. Jogou sempre com muita seriedade e respeito contra seus adversários e, no final, acabou tudo dando certo.

J10 – E esse jejum de 50 anos estava intragável…

Nelinho – Pelo histórico do Atlético, ele já merecia ter conquistado outros Brasileiros desde 1971. Era injusto estar tanto tempo sem ganhar esse título. Quando digo injustiça, falo de casos que aconteceram, oportunidades que o time deixou escapar, e até me incluo em algumas delas, mas principalmente fomos vítimas de erros de arbitragem. Veio em boa hora essa conquista, tira um peso enorme das costas de todos ali. Vejo o Atlético construindo seu estádio, que vai ficar maravilhoso, e ao ganhar um título dessa importância, tendo outro troféu de peso ainda por disputar (a final da Copa do Brasil), o clube está no caminho certo. Pode ter estado e continuar tendo problemas financeiros, mas agora a possibilidade de receber mais e maiores investimentos e títulos faz com que o clube possa voar de forma mais rápida.

J10 – A partir de agora, o Atlético se oficializa como potência nacional e, quem sabe, internacional?

Nelinho – No momento, Flamengo, Atlético e Palmeiras são as três principais forças do futebol nacional. São as equipes de maior investimento e isso está se traduzindo em resultados dentro do campo. Quando você vê um Atlético Paranaense se sobressaindo, em termos de título, mesmo com um investimento menor, é algo fora da curva, não é normal. Normal é quem mais investe, quem tem os melhores jogadores, terminar no topo da tabela.

J10 – Ter perdido a semifinal da Libertadores pode ter ampliado o foco dos jogadores do Galo?

Nelinho – Não necessariamente. Desde o começo da temporada o Atlético tinha como principal meta ganhar o Brasileiro. Para tirar esse peso dos 50 anos. Ainda foi eliminado da Libertadores saindo de forma invicta. De certa forma, isso pode até ter ajudado. É uma competição a menos com que se preocupar. Mas o alvo principal era o Brasileiro, desde o início. Libertadores é muito importante, mas no caso do Atlético, se perguntasse no começo do ano ao torcedor atleticano o que ele preferiria ganhar, caso tivesse que escolher um único título em 2021, creio que todos prefeririam o Brasileirão.

J10 – Agora, já campeões, perde-se um pouco desse foco para a disputa que se aproxima na Copa do Brasil?

Nelinho – Não acredito que esses jogadores se desviem do foco. Já comemoraram e tiveram tempo de se recuperar. Acredito que os principais jogadores não devam jogar contra o Grêmio, portanto chegarão inteiros no primeiro jogo contra o Atlético Paranaense. E da mesma forma que o Galo já ganhou uma competição, o Furacão já ganhou duas (Sul-Americana e Estadual). Duvido que o time paranaense se desligue por causa disso. Todos entrarão com tudo, dos dois lados. Primeiramente, por ser mais um título na carreira de cada um. Depois, porque é muita grana que entra no clube. Mas vai ser jogo duro. Nesse Brasileiro mesmo, o Atlético Mineiro teve dificuldades contra Chapecoense, perdeu em casa para o Fortaleza, ou seja, não tem jogo fácil. E se o Atlético Paranaense chegou a essa final, teve seus méritos. Não vai ser fácil ser campeão de novo, não.

J10 – Entre você e Hulk, quem chuta ou chutou mais forte?

Nelinho – Difícil mensurar. Às vezes você vai com muita vontade de chutar forte e a bola não toma o rumo certo. Não é questão de força, é jeito. O Hulk acerta chutes fortíssimos, assim como eu também acertava. Teria que analisar de todos os chutes que ele deu qual foi o mais veloz. Depois ver os meus, os do Roberto Carlos, os do Éder. Mas isso não vem ao caso. O importante é acertar o alvo, fazer o gol. Deve haver jogadores que chutavam ainda mais fortes do que nós, mas não marcavam gols constantemente. Bater tiro de meta é uma coisa, ter precisão é outra. Mas o Hulk está de parabéns até nisso. Ele está em grande fase e será merecidamente escolhido o melhor jogador do Brasileiro, além de ter terminado a competição como artilheiro.

J10 – Em relação ao futebol mineiro como um todo, como você analisa a entrada de possíveis investidores estrangeiros no América e essa nova frustração do Cruzeiro, que seguirá na Série B em 2022?

Nelinho – A entrada de empresários e a mudança para clube-empresa é a saída, principalmente, para o Cruzeiro. Não tanto para o América, que não tem tantos problemas financeiros. Seu problema é pequeno, se comparado aos principais clubes nacionais. Ainda tem uma gestão com pé no chão, capaz de conseguir manter uma equipe mediana e boa. Fico muito satisfeito de ver o América disputando uma vaga na Libertadores na última rodada, isso é ótimo para o futebol mineiro. Já em relação ao Cruzeiro, realmente, os homens que por lá passaram dilapidaram o clube de uma forma que não há outra saída a não ser gente de grana acreditar e colocar o seu dinheirinho lá. Se não fizerem isso, não acredito que volte no próximo ano para a primeira divisão. E temo até que caia para a terceira. Porque sem dinheiro não se contrata, e com isso precisarão colocar meninos da base para jogar. E disputar uma Série B com garotos complica. É preciso contar com atletas experientes, rodados, mas em aceitáveis condições físicas. A saída do Cruzeiro é essa e acho que isso vai acontecer. Acontecendo, acredito que em dois ou três anos o clube entre na linha e volte a ser tratado como o time grande que sempre.

Siga o Jogada10 nas redes sociais: TwitterInstagram e Facebook

Comentários