Com muita garra e disposição, Yuri Lara é um dos destaques do Vasco nesta Série B e um verdadeiro representante do torcedor em campo. Em cada disputa de bola, o volante de 28 anos coloca o coração na ponta da chuteira, afinal de contas, é vascaíno declarado. Essa identificação está mais forte a cada jogo e teve o ápice na vitória sobre o Cruzeiro, por 1 a 0, no último domingo. Em entrevista exclusiva ao Jogada10, o jogador revelou que ficou arrepiado com o Maracanã lotado, que o fez recordar dos tempos de arquibancada.
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“Na hora do escanteio, não vou para a área porque eu sou baixinho, então eu fiquei no meio do campo olhando. Não tinha um espaço vazio na arquibancada e isso me arrepiou. Vestir a camisa do Vasco, ganhando do Cruzeiro, o líder do campeonato, com toda aquela atmosfera, vai ficar marcado por muito tempo por me trazer lembranças boas da época que eu estava na arquibancada. No meu maior dos sonhos, eu nunca imaginei estar vivendo esse momento hoje, com 28 anos”.
O jeito aguerrido em campo, com muita intensidade na marcação, rendeu a Yuri Lara o apelido de Pitbull da Colina. A “pegada”, marca registrada do volante, o acompanha desde os primeiros chutes na bola, ainda moleque, no Parque Colúmbia, bairro da Zona Norte do Rio. Foi lá que o jogador foi forjado, nas peladas nas ruas e nos campeonatos de favela, onde a disposição muita das vezes vale mais do que a técnica.
“No campeonato de favela, se você baixar a guarda, entrar meigo, você se complica e os caras te atropelam. Eu não abaixava a cabeça para ninguém e levo isso comigo. Às vezes as pessoas pensam por eu ser baixinho, vou aceitar qualquer coisa e não é por aí, o caminho não é esse. Não sou maldoso, não sou desleal, mas também não vai chegar em São Januário e achar que eu vou deixar fazer o que quer. É isso que eu carrego comigo. A forma de jogar, de me impor dentro de campo. A minha carreira inteira foi assim”.
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Um jogador com essa característica faltou ao Vasco nas últimas temporadas. Não foi à toa que Yuri Lara foi a primeira contratação do clube para 2022. O volante chegou em São Januário credenciado por uma grande Série B no ano passado com o CSA, mas com certa desconfiança por jamais ter jogado em um gigante do futebol brasileiro. O maior foi o Bahia, o primeiro como profissional. Antes defendeu o Olaria e depois rodou por Tochigi, do Japão, Oeste e Ferroviária, até se destacar no time alagoano. No Cruz-Maltino, Yuri Lara pretende fazer história, mas sem deixar de sonhar com voos mais altos.
“Eu costumo ter os pés no chão. Sem dúvida o maior desafio da minha carreira é o Vasco. Eu joguei no Bahia, que também é grande, cheguei novo e tinha sonhos de ser vendido, de ir para a Europa, assim como amigos meus foram. Mas lá eu sofri muito com lesões e não consegui dar sequência. A minha vida acabou virando, tive que ir para o Japão, enfim. Hoje, onde estou, me dá uma proporção de ter um sonho realizado mais próximo. Eu penso em Europa, em Seleção Brasileira, mas hoje penso em fazer história no Vasco, ganhar títulos, marcar o nome no clube do meu coração”.
Bate-Bola com Yuri Lara
Como foi a sua trajetória no futebol até se profissionalizar?
“Eu joguei muito campeonato de favela. Eu jogava no Olaria, mas não tinha muito essa responsabilidade de não jogar na rua para não se machucar. Jogava mesmo, não estava nem aí. Eu não recebia nada do Olaria, não tinha contrato, então nada me impedia de jogar. Jogava peladas de rua, campeonatos. Tem um time lá no Parque Columbia, o Rato Velho, que é um dos times de lá que me chamava para jogar. Na favela né, não tem como ser devagar, tem que botar o pé firme, então sempre fui acostumado com esse tipo de jogo, mais firme”.
Esses campeonatos de favela costumam ser tensos. Tem algum perrengue que você passou?
“Eu lembro bem de uma situação lá no Acari, no Corta Rabo. Ali o bicho pegava. O time era do Projeto Mel. A gente foi jogar lá dentro. Eu vi armas que eu nunca tinha visto na vida. Era um jogo atrás do outro e passamos para a final. Estávamos esperando o time da favela que estava jogando a semifinal. Os caras passavam pela gente e falavam que se eles perdessem, iria dar merda. Falando alto para a gente escutar. Eu pensei comigo: ‘vou jogar, mas rezando para a gente perder, porque se ganhar, só Deus sabe o que vai acontecer’ (risos). Acabou que perdemos nos pênaltis. Eu fiz o meu, mas perdemos. O cara que perdeu (o pênalti) provavelmente estava peidando que nem eu (risos). A gente era tudo moleque e não ficava comentando para não ficar feio perante a rapaziada. Perdemos, ganhamos o troféu de segundo lugar e viemos embora”.
Conta um pouco do seu período no Olaria até chegar ao Bahia?
“Fiz minha base inteira no Olaria. Fiz bons campeonatos e tinha muita promessa de gente do Flamengo, do Vasco, que iria me ver, mas nunca me levava. Acabou que um treinador já falecido, o Chiquinho de Assis, da base do Bahia, foi para o profissional do Olaria e eu era um dos poucos da base que já jogava no time de cima. Esse treinador gostou de mim e me levou para o Bahia. Eu fiz dois anos de Júnior e subi para os profissionais em 2015. Fui galgando, rodando, até chegar aqui”.
Em quem você se inspira na sua posição?
“Pode ser um pouco diferente do meu estilo de jogo, mas eu gosto muito do Kanté, principalmente porque ele é baixinho que nem eu. O cara baixinho, jogar na Europa, em alto nível como ele joga e ainda tem a questão da pessoa dele, humildade pura. Gosto muito do Kanté e do Casemiro. Eu me espelho muito nele na questão da pegada. Ele é muito firme. Eu falo do Kanté por eu ser baixinho também, enquanto o Casemiro já é um armário, mas a forma que eles jogam, eu me inspiro, porque possuem pegada e técnica. É o que eu procuro para a minha carreira”.
Falando agora do Vasco, conta como foi a saída do Zé Ricardo? O que ele falou para você?
“Todos foram pegos de surpresa. Teve uma reunião de manhã com o presidente e foi anunciado. A despedida foi depois da reunião. Nos juntamos no campo, tiramos uma foto. O grupo do Zé era muito querido aqui. Passamos momentos difíceis, mas a gente confiava plenamente no trabalho do Zé, tanto que as coisas melhoraram. A gente fica feliz pelo Zé, pela oportunidade que ele teve. Era muita gente para se despedir, mas para mim ele disse para não deixar a peteca cair, que assim vamos conseguir o objetivo”.
E o Maurício Souza, quais são as primeiras impressões dele?
“Tivemos pouco contato, mas parece ser um cara bacana, íntegro e espero que possa dar continuidade e implementar o trabalho dele para que a gente possa ser feliz no final do ano. Ele vai encontrar um grupo f… aqui, que vai correr por ele”.
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Como você lida com o apelido de Pitbull e explica como você conseguiu passar o jogo inteiro do Cruzeiro sem cometer uma falta?
“Eu costumo ser o mais leal possível, até porque se eu fizer uma falta perto da área, a chance de levar um gol é muito grande, devido a qualidade dos batedores. O Thiagão pede muito isso, evitar falta perto da área. Eu viso a bola, mas o apelido de pit-bull, o fato das pessoas me verem brigando dentro de campo, pode até ter a impressão de que eu sou maldoso, mas é totalmente o contrário. Eu fiquei até assustado por não ter feito nenhuma falta no jogo e para um volante, que teve 7 desarmes completos, não fazer falta é uma boa estatística. É meu estilo de jogo, ser firme, mas sempre leal, visando a bola”.
O Vasco é o único invicto da Série B, isso motiva, dá mais confiança ou faz mais pressão no time? E qual foi o jogo que vocês estiveram mais próximos de perder?
“A gente não pensa muito nisso não. É difícil uma Série B se manter invicto, ainda mais nessa, que é uma das mais difíceis dos últimos tempos. Mas a gente não pensa nisso, pensamos em vencer. O jogo que estivemos mais próximos de perder foi contra o Tombense. Tomamos o gol, não nos encontrávamos no jogo, levamos o segundo, o VAR anulou, mas se fosse validado, naquele campo traiçoeiro, difícil de jogar, não sei como seria. Conseguimos empatar e não viramos por pouco. Dentro de campo eu não penso nisso, de entrar com medo de perder. A gente pensa em vencer e cada jogo é um jogo. Espero que isso continue por muito tempo”.
Como jogador, mas também torcedor do Vasco, qual é a sua opinião sobre a compra da SAF pela 777 Partners?
“Tudo que for bom para o Vasco, a gente tem que abraçar. Tinha salário atrasado no Vasco e com a ajuda da 777, a perspectiva é de que isso acabe e isso ajuda muito. Não só em salários, mas em estrutura, contratação, em tudo. Eu vejo isso sendo bom para o Vasco. Eu como torcedor, quero ver o Vasco campeão da Copa do Brasil de novo, disputar uma Libertadores. O Vasco é acostumado com isso e eu vejo que com a 777 a chance de a gente estar brigando novamente é muito clara e isso é bacana. É uma boa aposta, acho que vai ser bom para o Vasco, já está sendo com os salários em dia, não só o da gente, mas os dos funcionários também, que recebem menos e precisam ter os salários em dia. Isso tudo ajuda”.
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Você tem contrato até o final do ano. Qual é a sua expectativa para o futuro? Deseja renovar?
“Eu sei que não é o momento de falar sobre isso, por causa da 777, que gera uma indefinição, mas espero e quero muito ficar aqui. A família está feliz, eu estou feliz de voltar ao Rio depois de 11 anos fora. Estou muito feliz de estar vivendo esse momento e espero que tudo continue indo bem para a gente conseguir o acesso, comemorar no final do ano e querendo muito ficar aqui”.
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