Jorge Jesus – desde que cruzou o Atlântico de volta a Portugal e concluiu sua travessia além-mar -, resolveu se aproximar da figura do “tiozão do churrasco”, aquele tipo bonachão que, ao esquentar a grelha, entretém a reunião de domingo com trocadilhos e depois parte para o ataque contra o politicamente correto. O ex-treinador do Flamengo só não tem o timing para emular este personagem tão presente na família tradicional brasileira. Após um ano na Terra Papagalli, o Mister não aprendeu os nossos pormenores. Em dez dias, do alto de seus cabelos grisalhos, conseguiu transmitir a imagem de um lusitano machista, estúpido, tosco, obsoleto e desconectado da realidade, o oposto do portuga “sangue bom”, ídolo da Nação e cidadão condecorado por São Sebastião do Rio de Janeiro, a cidade mais plural do mundo.

Primeiro, Jesus foi extremamente grosseiro com uma repórter. Insinuou que ela não sabia nada sobre futebol. Na semana seguinte, minimizou o histórico levante antirracista de Paris e classificou o debate sobre o preconceito racial como “moda”. Alguém, por favor, avise ao treinador do Benfica que não é moda a morte de um negro a cada 23 minutos onde trabalhou em 2019! E que não houve nada relacionado à moda o seu país invadir territórios africanos para obter mão de obra escrava nas colônias! Mais uma declaração desastrosa, e ele terá direito a pedir música no Fantástico. ¿Por qué no te callas, Mister?

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Jesus não é mais aquele que levou o Flamengo ao topo da América do Sul – Russell Cheyne/AFP

O futebol se insurge contra o racismo, pela primeira vez, com robustez. Neymar, que durante tantos anos ficou calado, aderiu ao movimento “Vidas Negras Importam” e participou da rebelião liderada por Demba Ba, na última terça-feira, no Parque dos Príncipes, na capital francesa, na partida entre o Paris Saint-Germain e Istanbul Basaksehir, pela Champions. O craque brasileiro tomou, de imediato, as dores do auxiliar camaronês Pierre Webó, ofendido pelo quarto árbitro romeno. O camisa 10 é uma voz que pode fazer toda a diferença nesta luta. Companheiro de profissão e compatriota de Jorge Jesus, José Mourinho, às vezes marcado por sua arrogância, também se somou à batalha. Já as palavras do Mister não causaram nada além de indignação.

Se o racismo ainda persiste, a sociedade mostra que está mais vigilante para repudiar a injúria do quarto árbitro e as declarações de Jorge Jesus.

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