Sempre haverá Paris na célebre cena de despedida entre Rick Blaine (Humphrey Bogart) e Ilsa Lund (Ingrid Bergman), no clássico “Casablanca” (1942), do diretor húngaro Michael Curtiz. Sempre haverá Fernando Diniz no mercado brasileiro, despertando o fetiche pelo fundamentalismo das causas impossíveis. Pois o Santos, que acabou de criar condições adversas para perder o bom Ariel Holan em menos de dois meses, resolveu dobrar a aposta e contratar o treinador brasileiro mais badalado dos últimos anos. O dinizismo está de volta e, provavelmente, com novas cepas. Quanto tempo vai demorar para o Peixe entrar em campo sem cabeça de área, com Sandry na zaga, Alison na lateral direita, Pará no meio de campo e Marinho como centroavante? Quantos jogos até o primeiro alvinegro levantar-se do sofá, perder a paciência e pedir a cabeça do novo comandante?

Boa-praça, bem articulado, estudioso e formado em Psicologia, Fernando Diniz carrega consigo uma aura professoral. É sessão de filme iraniano de três horas de duração no fim da tarde, com direito a debate e nenhuma conclusão. Seus admiradores entendem as suas concepções e não ligam se seguem uma obra abstrata, sem resultados práticos. O mesmo entusiasmo não atinge os torcedores dos ex-clubes do treinador. Na padoca da Barra Funda, enquanto desfruta o café, Seu Jairo, um são-paulino dos quatro costados, afirma, com ironia, que desconhece o dito cujo. Nas pedaladas matinais entre o Cosme Velho e as Laranjeiras, Ana Siciliana e o filho Guilherme prometem que não deixarão o treinador pisar na sede do Fluminense nunca mais. “Não gosto!”, arremata o mancebo. Em Curitiba, a família de Alethea, toda Athletico-PR, está de prontidão para fechar as fronteiras do estado caso Diniz apareça por lá. “Menos mal que foi para o Santos”, respirou, aliviada, a matriarca no jantar de quinta-feira.

Em evidência desde 2016, quando levou o Audax ao vice-campeonato paulista e ao rebaixamento estadual no ano seguinte (sempre 8 ou 80), Fernando Diniz teve o mérito de convencer a opinião pública de que era o legítimo defensor de métodos pouco convencionais, como a posse de bola ao extremo e a forma agressiva de posicionar os seus futebolistas. Por isso, nesta sexta, os dinizistas apareceram agitados, cravando que o técnico é o nome ideal para reorganizar o DNA ofensivo do Santos, mesmo com o clube envolto em uma crise financeira e obrigado a queimar um jovem da base a cada 15 dias, no CT Rei Pelé.

Diniz chega à Vila Belmiro após passagens, em sequência, por três clubes da elite do futebol nacional. Nenhum título ou campanha de destaque. Pelo contrário. Por ordem cronológica: lutou contra a degola (Athletico-PR/Fluminense) e acumulou eliminações traumáticas (São Paulo). Porém, mantém as portas da Série A abertas por contar com a complacência da crônica esportiva, afinal, é o nosso principal postulante a Marcelo Bielsa (embora sabemos que não carrega as pranchetas do técnico argentino). O desempenho esportivo não importa. Basta ser diferente e apresentar um pouco mais de ousadia em um país de medíocres. Por isso, no Brasil, sempre haverá Fernando Diniz.

 

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